quinta-feira, 19 de junho de 2008

Série Contos de Fora

Série Contos de Fora

Luciano Bonfim




É com um orgulho besta que abrimos essa Porta Nordestina pra um cabra da melhor extirpe e cepa. Luciano Bonfim mora em Sobral no Ceará, seu centro do mundo, de onde ele espalha poesia. A criatura se dedica a criação de literatura da melhor qualidade. Olho de cobra, paciência de bode, orelha de cangaceiro... É um homem atento, desconfiado e sensível ao jeito de sua gente. A tragédia e a graça passam por sua escrita. A partir do seu olhar danado e santo ao mesmo tempo, dá autenticidade, mas principalmente universalidade aos seus personagens, são todos nossos irmãos.
O mundo é pequeno e o centro está em todo lugar, pena não se ter acesso fácil a esses artistas, que nem tão preocupados com essa barafunda midiática dos famosos do lado de cá. Às vezes parece que só tem o lado de cá. Tanto se fala e tanto se fala que isso acaba virando verdade e não é. Eles praticam a sua arte que parece que não existe só porque não aparece, mas a arte deles alimenta a alma de qualquer ser vivente do mesmo jeitim que as outras.
Esses contos são da sua última publicação “móbiles”, menos regional que outras também de igual valor. Mostraremos tudo em breve, aos poucos, todas as suas caras.

Chico Expedito





Não existe apenas uma forma de amor & prazer

No curso do tratamento psicanalítico há amplas oportunidades para colher impressões sobre a maneira como os neuróticos se comportam em relação ao amor; ao mesmo tempo, podemos nos lembrar de ter observado ou ouvido falar de comportamento semelhante em pessoas de saúde normal ou mesmo naquelas de qualidades excepcionais..[Contribuições à psicologia do Amor]
Sigmund Freud



Maria Bonita, antes de conhecer Virgulino Ferreira, o Lampião, a quem amou até a morte, foi casada com o sapateiro Pedro.
Cléopatra, rainha do Egito e do coração de Marco Antônio, amou o poder sobre todas as coisas e teve, segundo os relatos, momentos de prazer intenso com os seus magnânimos amantes. Diziam-na belíssima.
Oscar Wilde, que por algum tempo viveu devotadamente à sua esposa, com quem teve dois filhos, crianças para quem escreveu as suas histórias de fadas e encantamentos, amou de profundis a um impetuoso jovem inglês.
Calígula, de quem dizem barbaridades sobre a sua vida e os seus amores, indistintamente amou a homens e mulheres, preferindo, segundo consta, aos rapazes fortes e fogosos.
Niestzche alimentou platônicos amores e nunca teve relacionamentos duradouros; nem parcos amores viveu; na juventude, com uma que nem mesmo soube do nome, teve raras relações sexuais, o suficiente para contrair sífilis e terminar como sabemos.
Schopenhauer nunca morreu de amores pela própria mãe, preferindo dedicar-se a um pequeno cão, a música e a filosofia.
Hitler, algumas vezes acusado de sodomia, empestava de prazer as suas roupas íntimas quando discursava para o seu másculo exército.
Narciso amou a si mesmo e entregou-se ao desespero de não ser correspondido.
Tarzan amava Jane mas nunca se desligou da macaca Chita, a quem conheceu bem antes.
Os cães às vezes se amam na praça e sempre depois do gozo ficam, por algum tempo, engatados um ao outro, sendo motivo de risos para muitos e escândalos para tantos.
Alguns amam e sentem prazer com animais não humanos.
Outros sentem prazer com aqueles que não amam.
Tantos exatamente não amam àqueles com quem dividem a mesma cama. Outros vivem com aqueles que realmente amam e têm prazer. Alguns fingem o prazer que não sentem, e somente assim, têm o prazer que deveras fingem.
Muitos se masturbam todos os dias. Outros não se masturbam nunca nem de vez em quando têm relações sexuais e, no meio da noite, muitas vezes, acordam salvos pela polução.
Existiram Satúrnicas e Bacanais. Troca de casais existe, menáge a trois, também
O campo do amor é vasto, vocês sabem! Infinitas são as zonas de prazer!
Alguns, mesmo assim, nem querem saber de amor e sexo. Outros, todavia, não vêem a hora de tudo isso começar.








Por causa do gato lilás


Tarsila, uma gata siamesa, que conviveu conosco por alguns dias, apaixonou-se pelo ‘gato lilás’ de Aldemir Martins – uma reprodução da tela que possuímos em casa.
Investiu tudo nesta paixão, estudou sobre o artista e sua obra, incomodou a todos com o seu canto lastimoso e noturno, gastou as unhas arranhando os telhados alheios.
Não encontrando retorno algum desta paixão, chegou a cometer o suicídio 6 vezes, até decidir-se a pesquisar intensamente sobre arte contemporânea.
Certa noite, após buscar um diálogo intenso com a eternidade, ainda meio grogue e desolada, saiu para a rua e não mais a vimos.
Soubemos, algum tempo depois, que ela fora atropelada e tornou-se uma efêmera intervenção urbana.

LUCIANO BONFIM [Crateús/CE.]. Publicou: Dançando com Sapatos que Incomodam - Contos[2002]; Móbiles – Contos [2007]; Janeiros Sentimentos Poético[1992] e Beber Água é Tomar Banho por Dentro[2006] – Poesia ; escreveu e montou as peças: Auto do Menino Encantado[2002] e As Mulheres Cegas[2000 e 2004]; criador da revista Famigerado – Literatura e Adjacências[2005]; professor da Universidade Estadual Vale do Acaraú – UVA[desde 1996]; aluno do mestrado em Educação Brasileira[FACED-UFC/2006].

e-mail: luciano.bonfim@yahoo.com.br

Um comentário:

Herbert Macário disse...

Muito bom!
Luciano é um achado
Espero que continue com outras participações
Foi um prazer...
Grande abraço