sábado, 30 de agosto de 2008

Teatro

RÁPIDO DICIONÁRIO DE TEATRO

BERTOLT BRECHT



A obra de Bertolt Brecht é considerada uma das mais originais e universais do teatro contemporâneo. Dramaturgo, teórico, encenador, poeta, foi um completo homem de teatro. A tônica do seu trabalho foi a recusa radical das ilusões criadas pelo teatro clássico. Seu teatro, como ele mesmo o define seria o Teatro da era científica, também chamado de Épico ou Dialético. Brecht recusa as mentiras da arte e os artifícios habituais da época, em beneficio da crítica social. Retoma a teatralidade perdida com o naturalismo e é radical no seu combate. Afinal, o teatro historicamente nunca havia sido naturalista, os Gregos com seus altos coturnos, máscaras, representando ao ar livre e à luz do sol não o foram; a Comédia Del Arte em cima de suas carroças nas feiras tampouco e Shakespeare com seu palco Elisabetano cheio de elementos simbólicos também não o era.




família de Brecht

Nasceu em AugsburgAlemanha em 1898, numa família de industriais. Teve uma educação burguesa. Tentou se formar em medicina, chegando a trabalhar como enfermeiro em um hospital de Munique na 1ª guerra mundial, a mesma guerra o fez desistir de seguir carreira. Ainda em Munique estréia suas primeiras peças. Depois da guerra muda-se para
Berlim, onde o influente crítico, Herbert Ihering, chamou-lhe a atenção para interesse do público pelo teatro moderno, conheceu Erich Engel com quem veio a trabalhar até ao fim da sua vida. Somente em Berlim obteve seus primeiros sucessos. Com Hitler, eleito em 1933, Brecht não estava mais totalmente seguro na Alemanha Nazista, exilando-se na Áustria, Suíça, Dinamarca, Finlândia, Suécia, Inglaterra, Rússia e finalmente nos Estados Unidos.






A Russia retoma Berlim

Depois da guerra, após algumas hesitações, Brecht retorna a Alemanha para o Setor Oriental, onde o Partido insiste em usá-lo como propaganda. Embora comunista declarado, resistia e insistia em fazer um teatro mais humanista. Seu exílio havia sido o seu período criativo mais importante, onde escreveria suas grandes peças. Também durante a década de 30, Brecht havia refinado sua estética marxista, estava convencido de que os intelectuais tinham de desempenhar um papel decisivo na transformação da Alemanha durante aquele momento de crise e que se uma nova cultura socialista se desenvolvesse, nela deveria haver certa liberdade, especialmente para artistas e intelectuais. Eles não podiam simplesmente ser os porta-vozes da propaganda política do partido, "a exigência das obras de arte para nós é ainda mais alta: conteúdo e forma", escrevia. Brecht que nunca fugiu do conflito ou da crítica, ele acreditava que uma crítica eficaz era parte integrante da construção da nova cultura, se ele não pode ser visto totalmente como um vilão durante esse período, também não pode ser chamado de herói, ele tinha escolhas e fez acordos.



o Berlinen Ensemble

O Partido lhe concede um teatro e uma companhia para trabalhar, o Berlinen Ensemble. Lá ele desenvolve seus trabalhos teóricos e práticos sobre a arte da encenação e da interpretação, além de montar seus textos. Dirige o teatro junto com sua mulher, uma das mais famosas atrizes da Alemanha da época, Helene Weigel. Até hoje o Berliner Ensemble com a sua companhia, é uns dos mais respeitados, cultuados e estudados teatros do mundo. As primeiras influências de Brecht foram
Stanislavski, Meyerhold e Erwin Piscator. De Meyerhold aprofunda seu "método biomecânico" cuja principal intenção era fazer com que o ator exprimisse as nuanças psicológicas de seu personagem através de uma "máscara pantomímica", desenvolvendo a técnica de comentar o texto através do gesto. Técnica de inspiração asiática e que se tornaria evidente no teatro de Brecht. A contribuição de Piscator é a noção de um teatro propagandístico e educativo. É ele quem abre caminho para o verdadeiro teatro Épico teorizado e executado pelo encenador. Stanislavski era obrigatório, embora a principio pareça contraditório foi a apartir dessa base que Brecht vai desenvolver toda sua teoria.Também foram influências significativas os seus estudos sobre a sociologia e o marxismo.






Brecht e sua mulher Helene Weigel

Além de dramaturgo e encenador, Brecht foi responsável por aprofundar o método de interpretação do teatro Épico. Em seus escritos sobre teatro, Brecht relata a forma de interpretação de um ator chinês, Mei Lan-Fang, e repetia em palestras que esse ator ao representar papeis femininos, não era um mero imitador de mulheres. Descrevendo uma demonstração das técnicas deste ator , dizia que ele, de terno, executava certos movimentos femininos, ressaltando sempre a presença de duas personagens, um que apresentava e outro que era apresentado. Sublinhava que o ator chinês não pretendia andar e chorar como uma mulher, mas como uma determinada mulher
e que com aquela interpretação gestual, o público seria levado a exercer uma operação crítica do comportamento humano. Afirma ainda que cada palavra deve encontrar um significado visual através do gesto, assim o espectador poderia compreender as alternativas da cena.




Esta preocupação o levará a definir talvez os mais importantes conceitos do seu teatro, o conceito do distanciamento e o do gestus na interpretação e encenação dos seus espetáculos. Para entender o distanciamento e o gestus Brechtiano devemos entender a sua época.
O teatro Naturalista tinha sido aceito como a única convenção de palco possível na época em que ele nasceu. De uma forma radical e incisiva, talvez em função do momento e de como se praticava essa forma de arte. Brecht achava que o teatro era necessariamente político e que as classes dominantes em determinado momento haviam se apropriado do teatro e o utilizavam como instrumento de dominação. Achava que o teatro poderia ser também uma arma de libertação, sendo necessário apenas criar formas e conteúdos correspondentes.
A aristocracia anteriormente havia estabelecido divisões, alguns iriam para o palco e outros para platéia, de onde assistiam passivos e receptivos em vez de participar do ritual. Dessa forma a aristocracia refletia sua ideologia dominante. O próximo passo da burguesia tinha sido transformar os protagonistas, que haviam deixado de ser objetos de valores somente morais e começaram a defender outros valores, sempre das classes dominantes.
Brecht responde a estas idéias, convertendo o personagem de sujeito absoluto em objeto das forças sociais, não mais só de valores dominantes. Assim afirmava que o ser social determina o pensamento e não vice-versa.



Brecht e sua companhia

Para ele o teatro Naturalista da época era um teatro que criava uma poderosíssima ilusão da realidade. Tentava repetir a realidade em todos os seus elementos, na luz, nos cenários, nos figurinos, nos sons, além da criação da quarta parede na interpretação, ignorando por completo a presença do público. Dizia que esse público era submetido a uma espécie de catarse que os expurgava de suas “más emoções”, o que fazia com que eles deixassem o teatro aliviados e refrescados.
Conseguia isso, segundo Brecht, pôr sua capacidade de materializar diante do público uma ilusão de acontecimentos reais, colocando o publico dentro da ação e se identificando com o herói ao ponto de esquecer-se de si mesmo e não pensar. O publico sairia aliviado, mas desinteressado, dessinstruido e não aprimorado, este seria um teatro apenas culinário.
Brecht achava que a identificação com os personagens e as fortes emoções pelas quais a platéia passava, tornavam impossível o raciocínio (idéia bastante combatida, hoje e sempre), porque dessa forma o publico só veria o ponto de vista do herói. Isso já havia acontecido com público da Tragédia Grega e não deveria acontecer com as pessoas esclarecidas. Sem a capacidade da duvida não haveria como pensar sobre as implicações sociais e morais da peça, o público perderia o espírito crítico.
O novo teatro, o Teatro Épico (no final da sua carreira preferiu chamá-lo de Dialético) não só liberaria a faculdade critica da platéia como dispensaria ao encenador e dramaturgo, as convenções que a simulação do real lhe impunha. Dispensaria o ritual da exposição naturalista que se fazia através dos seus elementos (cenário, figurino, luz, sons, etc.), e o mais importante, eliminaria o elemento surpresa nas suas montagens (elemento tão prezado no teatro clássico), para isso, colocaria cartazes ou anunciaria com uma musica o que iria acontecer na cena seguinte, pensava que se o publico já soubesse o que iria acontecer, restaria apenas saber de que forma aconteceria e isso seria mais importante.
Com essa liberdade o teatro épico seria o único a representar a complexidade da condição humana numa era em que a vida do indivíduo não poderia ser compreendida isoladamente, ou seja, separada das tendências sociais, políticas, econômicas e históricas.


encenação do Circulo de Giz Caucasiano

O palco de Brecht se aproximava da sala de conferência na qual o publico acorre na expectativa de ser informado. A destruição da ilusão e a não identificação permitia ao publico olhar com objetivo critico as coisas mais familiares, o natural deveria ser tornado surpreendente. Todos os elementos teatrais como cenário figurino, musica, luz, etc., revelariam sua independência. Sua função seria além de localizar e completar a cena, comentar e criticar e mesmo que às vezes causasse estranheza, deveriam ter significação. Os atores trocavam de cenário ou se preparavam as vistas do público, a musica era necessariamente pouco melodiosa e bela, não pretendia emocionar nem envolver e sim informar, o publico deveria ouvir a letra que sempre comentava a ação. Era necessário lembrar sempre que estavam assistindo a um espetáculo preparado para aquela noite. Todos esses elementos juntos formam o que se entende por o efeito distanciamento criado por Brecht. O distanciamento é a condição criada que capacita o publico não se envolver emocionalmente com o representado, capacitando-o a olhar criticamente a cena. Distanciado.



Tambores da Noite

Na medida em que desmonta o processo Naturalista, mostra que há uma produção, que aquilo foi pensado e ensaiado. Na medida em que utiliza os elementos teatrais da forma que seja mais adequada para passar a idéia, cria um elemento estranho, esse elemento é o distanciamento. Também chamado de Efeito de estranhamento. A destruição da ilusão e a não identificação permitiria ao público olhar com objetivo critico para as coisas consideradas naturais.
O Gestus, elemento tão caro ao seu teatro, foi outra de suas contribuições ao espetáculo e a interpretação, ele determina o método pelo qual o diretor e ator enfrentam uma peça. O Gestus seria uma expressão clara e estilizada do comportamento social dos seres humanos em relação aos outros. Este termo que não significa apenas gesto, mais que cobre toda gama de sinais exteriores das relações sociais, inclusive a maneira de portar-se (Trabalho corporal na interpretação, entonação na voz, expressão facial) também leva em conta todo o palco, ou seja, todos os elementos que compõem o espetáculo.

Um Homem é um Homem

Cada cena de uma peça deveria ter seu gestus básico. Analisando a ação se determina a linha da história que é decomposta em elementos cada vez menores, até que cada cena pareça a expressão de uma ação simples, transformada em uma frase que contém uma idéia. Exemplo: Hitler travava o povo alemão como marionetes.
Essa idéia ou frase que contem o gestus básico é em que o encenador deverá se concentrar para deixar clara a cena para platéia. A distribuição dos atores em cena, os signos que carregam todos os elementos do palco, o modo de falar e se movimentar dos personagens devem ser levados a transmitir todas as implicações desse gestus básico. Não tem importância o aspecto que tal cena possa ter tido na vida real, o diretor está interessado apenas em evidenciar seu conteúdo e significação social.






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