BERTOLT BRECHT
A obra de Bertolt Brecht é considerada uma das mais originais e universais do teatro contemporâneo. Dramaturgo, teórico, encenador, poeta, foi um completo homem de teatro. A tônica do seu trabalho foi a recusa radical das ilusões criadas pelo teatro clássico. Seu teatro, como ele mesmo o define seria o Teatro da era científica, também chamado de Épico ou Dialético. Brecht recusa as mentiras da arte e os artifícios habituais da época, em beneficio da crítica social. Retoma a teatralidade perdida com o naturalismo e é radical no seu combate. Afinal, o teatro historicamente nunca havia sido naturalista, os Gregos com seus altos coturnos, máscaras, representando ao ar livre e à luz do sol não o foram; a Comédia Del Arte em cima de suas carroças nas feiras tampouco e Shakespeare com seu palco Elisabetano cheio de elementos simbólicos também não o era.
Nasceu em Augsburg – Alemanha em 1898, numa família de industriais. Teve uma educação burguesa. Tentou se formar em medicina, chegando a trabalhar como enfermeiro em um hospital de Munique na 1ª guerra mundial, a mesma guerra o fez desistir de seguir carreira. Ainda em Munique estréia suas primeiras peças. Depois da guerra muda-se para Berlim, onde o influente crítico, Herbert Ihering, chamou-lhe a atenção para interesse do público pelo teatro moderno, conheceu Erich Engel com quem veio a trabalhar até ao fim da sua vida. Somente em Berlim obteve seus primeiros sucessos. Com Hitler, eleito em 1933, Brecht não estava mais totalmente seguro na Alemanha Nazista, exilando-se na Áustria, Suíça, Dinamarca, Finlândia, Suécia, Inglaterra, Rússia e finalmente nos Estados Unidos.
O Partido lhe concede um teatro e uma companhia para trabalhar, o Berlinen Ensemble. Lá ele desenvolve seus trabalhos teóricos e práticos sobre a arte da encenação e da interpretação, além de montar seus textos. Dirige o teatro junto com sua mulher, uma das mais famosas atrizes da Alemanha da época, Helene Weigel. Até hoje o Berliner Ensemble com a sua companhia, é uns dos mais respeitados, cultuados e estudados teatros do mundo. As primeiras influências de Brecht foram Stanislavski, Meyerhold e Erwin Piscator. De Meyerhold aprofunda seu "método biomecânico" cuja principal intenção era fazer com que o ator exprimisse as nuanças psicológicas de seu personagem através de uma "máscara pantomímica", desenvolvendo a técnica de comentar o texto através do gesto. Técnica de inspiração asiática e que se tornaria evidente no teatro de Brecht. A contribuição de Piscator é a noção de um teatro propagandístico e educativo. É ele quem abre caminho para o verdadeiro teatro Épico teorizado e executado pelo encenador. Stanislavski era obrigatório, embora a principio pareça contraditório foi a apartir dessa base que Brecht vai desenvolver toda sua teoria.Também foram influências significativas os seus estudos sobre a sociologia e o marxismo.
Podem ser identificadas duas motivações principais para o Teatro Épico de Brecht: A concepção marxista do Homem, um ser que deve ser entendido observando-se o conjunto de todas as relações sociais de que participa, para evidenciar isso somente uma forma Épica ou Dialética seria capaz de apresentar as determinantes sociais das relações inter-humanas; O seu intuito didático, que exigiria a necessidade de um palco científico capaz de desmistificar as relações da sociedade, esclarecendo o público e suscitando a ação.
Além de dramaturgo e encenador, Brecht foi responsável por aprofundar o método de interpretação do teatro Épico. Em seus escritos sobre teatro, Brecht relata a forma de interpretação de um ator chinês, Mei Lan-Fang, e repetia em palestras que esse ator ao representar papeis femininos, não era um mero imitador de mulheres. Descrevendo uma demonstração das técnicas deste ator , dizia que ele, de terno, executava certos movimentos femininos, ressaltando sempre a presença de duas personagens, um que apresentava e outro que era apresentado. Sublinhava que o ator chinês não pretendia andar e chorar como uma mulher, mas como uma determinada mulher e que com aquela interpretação gestual, o público seria levado a exercer uma operação crítica do comportamento humano. Afirma ainda que cada palavra deve encontrar um significado visual através do gesto, assim o espectador poderia compreender as alternativas da cena.
Esta preocupação o levará a definir talvez os mais importantes conceitos do seu teatro, o conceito do distanciamento e o do gestus na interpretação e encenação dos seus espetáculos. Para entender o distanciamento e o gestus Brechtiano devemos entender a sua época.
O teatro Naturalista tinha sido aceito como a única convenção de palco possível na época em que ele nasceu. De uma forma radical e incisiva, talvez em função do momento e de como se praticava essa forma de arte. Brecht achava que o teatro era necessariamente político e que as classes dominantes em determinado momento haviam se apropriado do teatro e o utilizavam como instrumento de dominação. Achava que o teatro poderia ser também uma arma de libertação, sendo necessário apenas criar formas e conteúdos correspondentes.
A aristocracia anteriormente havia estabelecido divisões, alguns iriam para o palco e outros para platéia, de onde assistiam passivos e receptivos em vez de participar do ritual. Dessa forma a aristocracia refletia sua ideologia dominante. O próximo passo da burguesia tinha sido transformar os protagonistas, que haviam deixado de ser objetos de valores somente morais e começaram a defender outros valores, sempre das classes dominantes.
Brecht responde a estas idéias, convertendo o personagem de sujeito absoluto em objeto das forças sociais, não mais só de valores dominantes. Assim afirmava que o ser social determina o pensamento e não vice-versa.
encenação do Circulo de Giz Caucasiano
O palco de Brecht se aproximava da sala de conferência na qual o publico acorre na expectativa de ser informado. A destruição da ilusão e a não identificação permitia ao publico olhar com objetivo critico as coisas mais familiares, o natural deveria ser tornado surpreendente. Todos os elementos teatrais como cenário figurino, musica, luz, etc., revelariam sua independência. Sua função seria além de localizar e completar a cena, comentar e criticar e mesmo que às vezes causasse estranheza, deveriam ter significação. Os atores trocavam de cenário ou se preparavam as vistas do público, a musica era necessariamente pouco melodiosa e bela, não pretendia emocionar nem envolver e sim informar, o publico deveria ouvir a letra que sempre comentava a ação. Era necessário lembrar sempre que estavam assistindo a um espetáculo preparado para aquela noite. Todos esses elementos juntos formam o que se entende por o efeito distanciamento criado por Brecht. O distanciamento é a condição criada que capacita o publico não se envolver emocionalmente com o representado, capacitando-o a olhar criticamente a cena. Distanciado.